Temporais que nos cercam
Chuvas de verão, raios, ventanias, tempestades, e outros fenômenos climáticos que causam alagamentos e deslizamentos têm colocado a sociedade em alerta máximo. Os deslizamentos que atingiram a região serrana do Rio, alagamentos em 92 cidades de Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina, São Paulo, no Brasil, e países como Austrália e Alemanha, são típicos do verão. O verão no hemisfério sul teve início no dia 21 de dezembro de 2010 e terminará em 20 de março. A próxima estação será o outono, com previsões mais otimistas em relação à incidência dos fenômenos da natureza.
Para entender melhor as tragédias naturais que acontecem anualmente no Brasil e no mundo, especialmente na estação do verão, fomos conversar com o professor Hilton Silveira Pinto, diretor associado do Centro de Pesquisas Meteorológicas Aplicadas à Agricultura (CEPAGRI) da Unicamp.
Fomos encontrá-lo em sua sala, em meio aos computadores conectados à informação atualizada em tempo real para formação de nuvens, precipitação, formação de correntes elétricas (raios), queimadas, monitoramento por satélite e outros aparatos técnicos. Na parede, um certificado de cidadão corintiano (homenagem da Rádio Jovem Pan) em 1988, um quadro a óleo, retratando um céu cinza traçado por um raio, pintado pela esposa Matilde e, centenas de crachás de participação em Congressos e Fóruns, na Unicamp, no Brasil e em eventos internacionais, pendurados em um relógio. O prof. Hilton Silveira é um dos especialistas em pesquisas climáticas mais reconhecidos e entrevistados.ComunicaSAE: O senhor tem um forte envolvimento com o CEPAGRI, é uma referência quando se trata de pesquisas para as previsões meteorológicas. Conte um pouco da história e a importância desse trabalho.
Prof. Hilton Silveira: O CEPAGRI foi criado em 1983 com a intenção de preencher uma “lacuna” que existia na Unicamp, com relação às pesquisas de mudanças climáticas e as influências destas mudanças para a agricultura. Então, eu e o saudoso professor Antonio Celso Novaes Magalhães, do Instituto de Biologia, fundamos o CEPRAGRI.
ComunicaSAE: As mudanças climáticas estão causando mortes e enormes prejuízos à sociedade. Qual é a explicação para ocorrências tão fortes, como as que aconteceram na região serrana do Rio (Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo) e em alagamentos de cidades com planície, como Piracicaba, Sumaré e sul de Minas?
Prof. Hilton Silveira: Existe um sério problema de planejamento urbano e rural para prevenção de catástrofes, das mais graves às mais amenas. Todo o acúmulo de chuvas e mapeamento das zonas de convergência estava previsto por vários Institutos e as prefeituras tinham conhecimento da gravidade. Dias antes do Natal já se tinha conhecimento, mas não tomaram providências.
ComunicaSAE: A falta de planejamento e prevenção é de qual (ou quais) esferas?
Prof. Hilton Silveira: O Brasil tem tecnologia, centros de pesquisas de ponta, condições técnicas e humanas de prever, divulgar e prevenir as catástrofes. Tem condições de traçar planejamento que atenda a população em casos de emergência. Mas falta a vontade política e administrativa. Qual o prefeito que vai dizer: “Aqui não pode construir, porque é área de risco” ? A medida é impopular e não traz votos nas próximas eleições. Os erros vêm de décadas, então é preciso traçar planos para minimizar o que está feito.
ComunicaSAE: O Ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante disse em entrevista coletiva, no Rio, em 21 de janeiro, que vai criar a Rede Nacional de Monitoramento e vai fortalecer as Defesas Civis nas cidades. Segundo ele, o trabalho vai levar quatro anos para operar totalmente. Qual é a sua opinião sobre as medidas propostas pelo Ministro Aloizio Mercadante?
Prof. Hilton Silveira: São medidas que já deveriam ter sido implementadas em governos anteriores, desde o nível federal, estadual até o municipal. É preciso vontade política, repito. A Defesa Civil precisa ser fortalecida, hoje ela está sem o mínimo planejamento. É necessário integrar os órgãos especializados em mapeamento climático, levando em consideração o mapeamento geológico de cada região com área de riscos. O Ministro está no caminho certo. Ele e o Carlos Nobre (pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-INPE e do Programa Internacional de Geosfera-Biosfera-IGBP) são competentes e vão fazer um bom trabalho, é o que todos esperam.
ComunicaSAE: Em Campinas e região, temos áreas planas, diferentes da região serrana do Rio, reconhecidamente de risco e, mesmo assim, sofremos temporais com muitos raios e alagamentos de algumas áreas.Por que isso acontece se não temos grandes rios? E na Unicamp, quais são os riscos?
Prof. Hilton Silveira: Geralmente a maior incidência de temporais na região de Campinas é no período da tarde ou noite. Isso acontece porque há muita umidade e temperatura elevada. Os meses de verão são os mais chuvosos. Isto é normal da estação de verão. O que as pessoas precisam saber é se prevenir, evitar locais de riscos, de inundações rápidas, como a Avenida Orozimbo Maia. Na Unicamp já tivemos incidência de tornado que destelhou o Ginásio de Esportes, em 2008. A Área próxima ao Ginásio, na baixada também já alagou diversas vezes.
ComunicaSAE: É verdade que um raio nunca cai duas vezes no mesmo local?
Prof. Hilton Silveira: Não. Um raio pode cair até mais de duas vezes no mesmo local. Basta ver um pára-raio. O resto é mito popular. Importante dizer se houver uma tempestade com raios, o lugar menos apropriado é ficar embaixo de uma árvore e o melhor, é ficar dentro de um carro, desde que a rua não esteja com risco de alagamento. Neste caso, nunca vá para as ruas baixas, sempre procure as ruas mais altas. Olha, não se esquece de escrever que eu sou corintiano, com muita honra!