Homenagem aos "90 anos da Semana de Arte Moderna” com mostra de livros raros e especiais
Raridades para serem apreciadas com tempo e emoção!
Uma área especial da Biblioteca Central Cesar Lattes (BC), da Universidade de Estadual de Campinas (Unicamp) - reúne obras raríssimas e um acervo valioso de grandes nomes da Literatura, História, Sociologia. Em comemoração aos 90 anos da Arte Moderna, a BC realiza a exposição de 39 obras raras e especiais dos acervos de Sérgio Buarque de Holanda, Alexandre Eulálio e Aristides Cândido de Mello e Souza. A mostra pode ser vista no 3º piso da Biblioteca Central Cesar Lattes, na Área de Coleções Especiais e Obras Raras, de segunda à sexta-feira, das 9 às 17 horas. A mostra foi aberta em fevereiro e segue até o final de abril de 2012.
Coleções Especiais
O acervo das Coleções Especiais da BC-Unicamp é constituído por livros e obras raras que pertenceram à importantes personalidades da vida acadêmica brasileira. Essas bibliotecas foram doadas ou compradas pela Unicamp. O acervo é formado por aproximadamente 80.000 volumes distribuídos em quatorze coleções na área de Ciências Humanas: História - História da Arte e Iconografia, Antropologia, Ciências Sociais, Literatura e Filosofia.
Coleção Sérgio Buarque de Holanda
Sérgio Buarque de Holanda, pai do cantor e compositor Chico Buarque, é considerado um dos maiores historiadores e estudiosos da cultura mundial. Foi crítico literário e professor de História da Civilização Brasileira na Universidade de São Paulo (USP). Nasceu em 1902 e sua coleção foi adquirida pela Unicamp em 1982, ano de seu falecimento.
A coleção é formada por 8.513 livros, 227 periódicos e 600 livros raros. Alguns desses livros, cerca de 49, são dos séculos XVI, XVII e XVIII. Entre eles, destaca-se a obra Ramusio Navigationi et Viaggi, publicada em Veneza em 1554 a 1559, em 3 volumes. Várias obras têm grifos e anotações pessoais, além de dedicatórias de pessoas ilustres como Tarsila do Amaral, Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Guilherme de Almeida e Manuel Bandeira.
Uma das dedicatórias para o historiador está no livro A Trilogia do Exílio, de Oswald de Andrade. “Para o alto espírito de Sérgio Buarque de Holanda, affectuosamente (sic) Oswald de Andrade 1922”.
Outra vem do poeta Guilherme de Almeida, na obra A Dança das Horas: “Para o Sérgio, este abraço attico (sic) do Guilherme-Rio-1925”.
Coleção Alexandre Eulálio
A Coleção Alexandre Eulálio tem 12 mil volumes. É um dos mais importantes acervos da Biblioteca Central da Unicamp e também um dos mais consultados pela comunidade universitária. Conta com aproximadamente 130 obras raras que datam do período compreendido entre o século XVI ao XX. Crítico literário, ensaísta, professor de Teoria Literária e um dos fundadores do Instituto de Estudos de Línguas (IEL) da Unicamp, Alexandre Eulálio obteve obras raríssimas como o Flos Sanctorum, obra sobre a vida de santos do século XVI, escrita por Frei Rosário, da Ordem de São Domingos. Tarsila do Amaral dedica palavras de afeto para Alexandre Eulálio: “Para Alexandre Eulálio, com simpatia e amizade. – Tarsila, 1968.Eulálio nasceu em 1930 e faleceu em 1988.
Os visitantes podem contemplar outras coleções importantes, como a de Paulo Duarte, jornalista, antropólogo, escritor, um dos fundadores do Departamento de Cultura e Museu da USP, do qual foi diretor até 1969.
Compõe o acervo raro, livros de Jean de Lery (1585), Rocha Pita e Brito Freire (1675), Ulsius (1628),Gandavo, La Condamine (1788), e da maiorparte de viajantes como Nieuhoff (1682), Martius, príncipe Maximiliano, Spix e Martius, Saint Hilaire, Crevaux, Maria Graham e Koster.
Coleção de médico que estudou termas de Minas Gerais
Outro médico que figura entre as coleções raras é Aristides Cândido de Mello e Souza, nascido a 1885 e falecido em 1942, estudioso da saúde em Poços de Caldas, Minas Gerais. Em 1989, a coleção de 3.500 volumes foi doada pelo filho, professor Antônio Candido de Mello e Souza, doutor honoris causa pela Unicamp.
Em entrevista em 2004, à Sala de Imprensa da Unicamp, em matéria do jornalista Luiz Sugimoto, Antonio Cândido fala sobre a doação da Biblioteca de seu pai. “São 3.500 volumes, dos quais a maioria absoluta é formada por livros meus. O resto consta de livros que foram de meu pai, minha mãe e meus irmãos, mas em proporção bem menor. Esclareço que a biblioteca médica de meu pai foi doada por minha mãe em 1960 à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Ainda: que parte dos livros de minha mãe foi doada à Faculdade de Filosofia de Poços de Caldas, cidade onde ela nasceu, onde meu pai foi diretor dos Serviços Termais e depois médico clínico. Finalmente: ainda há centenas de livros deles que estão comigo e com um de meus irmãos. A doação foi feita em nome de meu pai a fim de prolongar a sua memória. A escolha de Campinas se deve não apenas à minha ligação com a Unicamp, mas devido ao papel da cidade na formação de meu pai, que aí fez a maior parte do curso secundário, três anos de 1901 a 1903, no famoso Culto à Ciência. Vindo de uma pequena cidade mineira, Campinas foi para ele uma grande experiência no plano da cultura e da sociabilidade. Por isso foi sempre apegado a ela e certamente gostaria de saber que o seu nome está ligado à Unicamp”, esclarece. O principal tema de concentração do acervo é a Literatura francesa e a brasileira.
Coleção de médico de Dom Pedro II
Entre as obras raras, encontra-se a coleção de Theodor Peckolt, doutor em filosofia, renomado farmacêutico e pesquisador alemão que viveu no Brasil. Médico a serviço de Dom Pedro II,foi encarregado de várias Comissões científicas no Brasil e na Alemanha.
Coleção Maurício Knobel - um médico psiquiatra renomado, com histórias incríveis
Marcelo Knobel doou à Unicamp a sua coleção com 1.370 volumes, ainda em vida, no ano de 2006. Ele nasceu na Argentina em 1922 e faleceu em 2008.O médico foi um dos mais renomados psiquiatras da América Latina e suas obras são referências na área médica, na especialidade de psiquiatria.
As muitas histórias de sua vida foram contadas em entrevista concedida ao jornalista Clayton Levy, Sala de Imprensa-Unicamp, em março de 2006. Knobel atuava como docente na Universidade de Buenos Aires- Argentina, e deu aulas a um aluno que viria a se tornar um ícone da história política e social da América Latina: Ernesto Che Guevara. Knobel foi recebido por Evita Perón e nomeado pessoalmente por ela para o cargo de médico plantonista de um Hospital Psiquiátrico de Buenos Aires. Ele também teve um encontro de dez minutos com o Papa Paulo VI e recebeu a Medalha do Ano Santo, mesmo sendo ateu convicto. Corria o ano de 1976, quando estourou uma situação de crise política devido à renúncia de Evita Peron na presidência daquele país. Na ocasião, recebeu uma carta do próprio “Zeferino Vaz”, criador da Unicamp, convidando-o para implantar o Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Aceitou o convite, adotando o Brasil como sua Pátria de coração organizou o Departamento, nomeou equipes, abriu a enfermaria da área e dedicou-se a longas pesquisas, tendo como linha de estudos a adolescência e novos métodos de tratamento da saúde mental. Mais de 300 trabalhos científicos foram publicados, 52 capítulos de livros e 12 livros.
De sua obra, destacam-se “A Adolescência Normal” em coautoria com Arminda Aberastury e a “Psicoterapia Breve”, além de “Adolescência e Família” e “Orientação Familiar”, obras que tornaram-se referências para a Psiquiatria mundial.
Cesar Lattes, o único brasileiro que “quase” ganhou o prêmio Nobel
No mesmo andar da exposição, um espaço abriga as obras do físico e professor da Unicamp, Cesar Lattes. A reconstituição do escritório de Cesare Mansueto Giulio Lattes inclui todo o seu material bibliográfico (além de fotografias e objetos pessoais) e reproduções do acervo documental. Os originais estão guardados no Arquivo Central da Unicamp (Siarq). A coleção foi doada à Unicamp em 2005 e compõem-se com 1.828 volumes de física, matemática, literatura e várias obras de referência.
Nascido em 1924 e falecido em março de 2005, o físico, que dá o nome à Biblioteca Central, tem a história de ser o único brasileiro que “quase” levou o prêmio Nobel, em 1950, quando descobriu uma nova partícula atômica, o méson pi (ou pion), que revolucionou o mundo da ciência. Segundo consta, Lattes foi o principal pesquisador e primeiro autor de um artigo revolucionário publicado na Revista Científica Nature, descrevendo o méson pi, mas o seu colega Cecil Powell foi o único agraciado com o Nobel de Física em 1950. A política do Comitê do Nobel, até 1960, era a de premiar apenas um membro da equipe.
Lattes foi um dos maiores cientistas brasileiros, ganhando o reconhecimento mundial e inúmeros prêmios. Foi um dos fundadores do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que em sua homenagem desenvolveu a plataforma de Currículo Lattes.
Outra coleção interessante, com 2.083 livros, foi doada pelos filhos do professor Jose Albertino Rodrigues, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). O acervo tem obras de Sociologia e de Ciências Humanas.
Albertino foi o criador do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio Econômicos (DIEESE), em 1955, tornando-se um importante marco aferidor de regulação dos ganhos salariais da massa de trabalhadores em relação ao custo de vida. Com uma história de lutas e conflitos durante a ditadura militar, suas pesquisas versam sobre os trabalhadores e suas situações socioeconômicas, além de desafios na criação de novas instituições sociais. Foi docente da Universidade de Brasília (UNB), trabalhou com Darcy Ribeiro e Oraci Nogueira, dois grandes educadores brasileiros. Nasceu em 1923 e faleceu em 1992, em trágico acidente automobilístico.
Gibi nº Um da Mônica está entre as Coleções Especiais
Ao visitar essas belíssimas coleções, vale a pena conferir outras curiosidades, como a coleção de Histórias em Quadrinhos, doada por Jordano Quaglia Junior, ex-aluno da Unicamp. A coleção tem 8.980 gibis, das décadas de 60 até 90.
Outros números: 3.000 volumes sobre a América Latina; Cerca de 800 volumes para a Coleção Iconográfica, doada por editores e sociedades civis; Coleção Novo Mundo, com 244 obras doadas à Unicamp por Editora, por ocasião dos 500 anos de descobrimento da América.
História da Arte em microfichas
Uma preciosidade para quem gosta de pesquisar a História da Arte. Trata-se da Coleção Cicognara, com 3.614 títulos, datados do século XVI ao XIX, catalogados em formato de microfichas. O projeto temático para a Biblioteca Cesar Lattes foi possível com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa (FAPESP) , em 2004.
Historiador, crítico de arte, bibliófilo e pintor, o conde Francesco Leopoldo Cicognara torna-se célebre com a obra Storia della sultura dal suo risorgimento in Italia sino al secolo di Canova (6 volumes). Em 1824, ele vende suas obras à Biblioteca Apostólica Vaticana. Nasceu em 1767 e faleceu em 1834.
A coleção Oficina do Livro “Rubens Borba de Moraes” conta com 40 mil volumes e foi doada à Unicamp, em 2006, por Claudio Giordano que deu a Oficina o nome de Rubens Borba de Moraes. Moraes foi importante bibliotecário, historiador e pesquisador brasileiro, um dos organizadores da Semana da Arte Moderna de 22, pioneiro na área de biblioteconomia no país e diretor da Biblioteca das Nações Unidas (ONU). A Oficina do Livro era uma associação civil sem fins lucrativos, de âmbito nacional, que tinha por finalidade trabalhar em prol da recuperação e preservação da memória cultural, manifestada através da palavra escrita.
Diante de tantas novidades e raridades, ao leitor cabe reservar um dia, ou pelo menos uma tarde, para a degustação de tão nobre lazer cultural. O espaço é aberto ao público!
Maiores informações: www.sbu.unicamp.br - Fone: (19) 3521-6464
Exposição organizada por: Isabella Nascimento Pereira e Fernanda Cristina Festa Mira
Colaborou com esta matéria:Tereza Cristina Oliveira Nonatto Carvalho - Diretoria de Coleções Especiais e Obras Raras
Fotografias: Magdaelei Amorim-ComunicaSAE e Paulo Azeviche (bolsista)